quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

A arte dos quadrinhos e o seu constante diálogo com outras artes

Interessante observar - e refletir sobre - o quão abrangente e rica é a linguagem das Histórias em Quadrinhos. Esta, consolidada em meados do século XIX e em eterna evolução, mantém-se em constante diálogo com outras expressões artísticas, tais como a pintura, a literatura e a fotografia - bases fundamentais da sua constituição -, o cinema, a música, a poesia e outras.

As HQs (como são chamadas comumente), desenvolveram-se, como alguns autores afirmam, simultaneamente com a civilização humana. Evoluíram a partir das pinturas rupestres, passando pelos hieróglifos da cultura egípcia, posteriormente viu a criação da imprensa, o avanço da industrialização e da ciência e, com elas, o avassalador desenvolvimento tecnológico - do qual, obviamente, se alimenta nos dias de hoje. Trata-se de uma linguagem única - resultado da junção do texto com a imagem -, justamente pelo seu caráter abrangedor e assimilador de outras expressões artísticas.

Assim, as HQs são de interesse e motivo de reflexão pelo fato de que, por meio de uma única (e boa!) história dessas, tomamos contato com diversas outras expressões artísticas - o que aciona diversas competências leitoras que temos, estimulando nosso cérebro -, além de nos levar a pensar no quão importante elas são, pois constituídas a partir da diversidade cultural que nos cerca. É uma linguagem híbrida, extremamente veloz e de fácil assimilação em relação ao que é exposto - o que a torna perfeita diante da velocidade do nosso século.

Dito isto, exemplifico essa característica do diálogo com outras artes por meio do trecho da história Wolverine - Arma X*, de Barry W. Smith (desenhos e roteiro), que segue:


Eu tô fugindo!

De um sonho!
E alguma coisa tá atrás de mim!
Na minha cola...
Como uma sombra!
Ela quer me sufocar...
Na sua escuridão!
Aí não vou poder gritar...
Nem resistir...
Porque ela tá dentro de mim!
Nas minhas tripas...
Dentro dos meus ossos!
       (...)
Tá me alcançando...
Se arrastando nas minhas veias feito corda!
Os tendões são fios...
Como de marionete.
Tá me cortando...
Me arrastando de volta pras trevas!


Pesadelo sem fim...

Ondas pretas correndo na noite...
Líquido...
Como sangue preto!
E eu não consigo escapar!
Tá nos meus ombros,
Me cortando com espetos!


Tá respirando dentro de mim...

E eu tô inspirando seu bafo quente!
Fedor de morte na minha boca!
Eu não consigo escapar!
Mas tenho que...
Fugir! Fugir pra sempre...
Lutar pra sempre!
A fera!
     (...)
Desabando sob o peso da fera.



Isso é nitidamente poético! Dialoga com a poesia. Trata-se de uma metáfora da luta interior que travamos com nossos medos, nossos instintos animais - feras que podem, a qualquer momento, nos devorar. Aí está uma demonstração do que foi dito sobre a arte dos quadrinhos. De como esta se constitui a partir da assimilação de outras linguagens artísticas e torna-se única e independente.



P.S.: A relação aqui feita, entre quadrinho e poesia, não tem o intuito de torná-lo maior em virtude da aproximação com a literatura, mas sim ressaltar tal característica e, justamente por isso, o quão interessante e importante ele é. Visa, pois, contribuir para tirar os quadrinhos do âmbito tão somente infanto-juvenil e garantir-lhe a sua importância como objeto artístico-cultural!




*A referida história foi publicada na revista "Wolverine Extra" - nº 1, pela editora Abril, no ano de 1995 - edição especial,  formatinho. O trecho citado encontra-se nas últimas páginas da publicação.






 

Um comentário:

  1. Legal, texto com linguagem simples e esclarecedor, tirando algumas das dúvidas sobre quais benefícios pode vir da leitura de uma HQ, e também lança curiosidades de ler esse título que é usado de exemplo e outros títulos !!!!

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