quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Ao peculiar (e assombroso) 7 de SETEMBRO DE 2021

Há mais de 50 anos, lá nos anos 60 do século XX e no início da Ditadura Militar no Brasil, o (então exilado) poeta amazonense Thiago de Mello (1926) escreveu FAZ ESCURO MAS EU CANTO: porque amanhã vai chegar. Deste livro, transcrevo (em caixa alta) uma estrofe do poema CANTO DE COMPANHEIRO EM TEMPO DE CUIDADOS:

O TEMPO É DE CUIDADO, COMPANHEIRO.

É TEMPO SOBRETUDO DE VIGÍLIA.

O INIMIGO ESTÁ SOLTO E SE DISFARÇA,

MAS COMO USA BOTINAS, FICA FÁCIL

DISTINGUIR-LHE O TACÃO GROSSO E LUSTROSO,

QUE PISA  AS FORÇAS CLARAS DA VERDADE,

E ESMAGA OS VERDES QUE DÃO VIDA AO CHÃO.

O TEMPO É DE MENTIRA. NÃO CONVÉM

DEIXAR LIVRE O MENINO DA ESMERALDA.

MELHOR É PROTEGÊ-LO DA VIOLÊNCIA

QUE AMARRA  A LIBERDADE EM PLENO VÔO.

A SOMBRA JÁ DESCEU, E MUITAS FAUCES

FAMINTAS SE ESCANCARAM FAREJANDO.

CUIDADO COMPANHEIRO, ESCONDE A ROSA,

ESPANTA A MARIPOSA COLORIDA,

É PERIGOSA ESSA CANÇÃO DE AMOR.

Que as nuvens escuras, cada vez mais volumosas em nosso céu, se dissipem e que o sol possa, com liberdade, brilhar sempre! E que esse peculiar e assombroso 7 de setembro de 2021 não se torne uma incessante tempestade.

sábado, 19 de junho de 2021

19 de junho de 2021

Brasil.

500 mil mortos!

MEIO MILHÃO DE MORTOS!

mas

mais de um ano depois

e depois de milhares de mortos

a Covid

19

tornou-se um convite

e uma ode

à Morte.

?


e a gente

indiferente.

?

domingo, 30 de maio de 2021

O estranho Porvir em OMAC, de Jack Kirby

É sempre interessante conjecturarmos, a partir do passado e inseridos num dado presente, sobre as possibilidades de um possível futuro. Algumas dessas conjecturas materializam-se esteticamente, é o caso de OMAC - Operativo Máximo para Ações de Combate (Panini, 2021), criação do quadrinhista estadunidense Jack Kirby (1917-1994) para a DC Comics, nos idos da década de 1970.

O quadrinho é uma distopia futurista que resvala em 1984, de George Orwell, e vai além por sua criativa inventividade - mesmo centralizando-se no âmbito do gênero Super-herói. OMAC é um super-homem modificado tecnologicamente por um singular satélite espacial denominado de Irmão-olho, uma Inteligência Artificial resultante de uma secreta e avançadíssima tecnologia. Assim, em um universo onde homem e máquina se confundem, o jovem inseguro e desajustado socialmente Buddy Blank é recrutado pela AGP - Agência Global de Paz e torna-se o heroico OMAC, o "exército de um homem só", combatendo todo tipo de ameaça criminosa. 

Obviamente que tão somente isso, por si só, não mereceria uma resenha como esta, pois isso é o básico em qualquer universo ficcional das HQs de super-heróis. O que realmente chama a atenção, e que verdadeiramente suscita qualquer discussão, são os perigos que surgem no Porvir - o futuro que J. Kirby criou -, germinado a partir da soma de vasto poderio tecnológico mais a insensibilidade e ganância humanas. São, portanto, as ideias referentes ao futuro da humanidade que fazem com que a obra, dos anos setenta (é bom frisar), seja bastante interessante e mereça ser discutida.

A primeira delas surge, estranha e inquietamente, já na capa da HQ: a mulher, até então vista como objeto de prazer, é retratada como um "brinquedo" montável ("Amiga para montar", um ambíguo nome) que engana, seduz, confunde e, nas mãos do crime, explode seu alvo. E ainda: uma organização mundial de segurança e paz, sem distinção de nacionalidade entre seus membros graças a um spray cosmético que manipula a pele do rosto, modelando a todos de igual forma. E mais outra: venda ilegal de corpos jovens com o intuito de receber os cérebros, via cirurgia computadorizada, de sexagenários sem escrúpulos e abastados financeiramente ("Corpo novo, alma velha", literalmente - como nomeado em um dos capítulos).


Além desses, há vários outros conceitos a permear as páginas que compilam as oito edições da série nesse único volume. Alguns muito intrigantes - como veículos que se locomovem com energia magnética, similar a um ímã - e outros tantos assombrosos: pessoas miseráveis, aparentemente moradores de rua, que se submetem a experimentos radioativos ou hormonais e tornam-se monstros que passam a trabalhar para a criminalidade - única alternativa financeira; super-ricos, a elite econômica que pode ALUGAR (isso mesmo!) cidades inteiras para suas festivas excentricidades. Ideias bastante peculiares que se concretizam no Mundo do Porvir - o espaço ficcional da história.

Explicações simples, mas muito verossímeis, tornam-nas bastante críveis dentro do universo de OMAC, ainda mais quando levamos em conta algumas particularidades referentes ao contexto histórico da época em que Kirby o concebeu (Guerra Fria, Ameaça nuclear, Corrida espacial, Avanços tecnológicos etc.). Por mais incríveis, absurdas e insólitas que possam parecer, como roubar a água de rios e oceanos, condensá-la em pequenos blocos pesadíssimos e chantagear outras nações à adquiri-la, tais ideias ainda são bastante lógicas e racionais dentro da narrativa. E isso, essa verossimilhança, é algo grandioso nas tramas da personagem.

Jack Kirby, que criou, roteirizou e desenhou OMAC, é mesmo um gênio da 9ª Arte. Incontestavelmente! Não apenas por estar no cerne das maiores criações do universo dos quadrinhos, como Capitão América, Quarteto Fantástico, Senhor Milagre, X-Men, Novos Deuses, Thor dentre inúmeras outras, mas pelo modo como as materializa. Seu traço é simples, porém preciso, seguro, direto; seu texto é inteligente, criativo e visionário e a junção de ambos (arte e palavra) resulta numa dinamicidade e plasticidade únicas. Seus quadros movimentam-se e fazem ruídos, com um ritmo, uma harmonia e vivacidade marcantes. E tudo isso aparece em OMAC, a cada virar de página. Que artista!

Não obstante isso, essa riqueza no trabalho com os elementos constitutivos da linguagem dos quadrinhos, OMAC - Operativo Máximo para Ações de Combate ainda consegue escapar ao maior clichê do gênero Super-herói: apesar de parecer, ele não é invencível! Quem vier a ler a presente edição ficará espantado com o final. Isso porque o confronto entre máquinas inteligentes (talvez o próximo estágio evolucionário) e o homem pode representar o fim de ambos, já que isso parece ser, ao menos no quadrinho, um caminho ascendente e sem volta de evolução e degradação da humanidade. Essa é a triste, mas importante, reflexão à qual chegamos ao final da leitura desta singular criação de Jack Kirby. Pode ser, portanto, um alerta, um aviso e uma oportunidade para conjecturarmos outros caminhos possíveis para o futuro, outras possibilidades para o nosso Mundo do Porvir.




quinta-feira, 11 de março de 2021

Dois Haicais (frutos da pandemia e da quarentena)


nesse breu escuro

decerto ainda haverá

Luz: nosso futuro

         (Haicai LIV)


        Depois desses dias

de abraços urgentes

iremos além: faremos

(en)laços ardentes

         (Haicai LVI)