quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Obra final

O sujeito acordara tomado de inquietude. Levantou-se sobressaltado, a mente um fervilhão só. Andou de um lado a outro pelo seu pequeno quarto, cujas paredes de aspecto mofado iam do chão ao teto, apinhadas de livros, cadernos gastos, papéis e mais papéis. Ele sabia que, hoje, talvez agora mesmo, escreveria algo grandioso; algo que marcaria indelevelmente as Letras  universais.

Agarrou prontamente a caneta, alcançou um caderninho todo rabiscado, feito em material barato e... Nada. A mente em rebuliço fechara-se. E um desfile de trivialidades atravessou suas avenidas principais.

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Jogou tudo a um canto, com estardalhaço. Passou a mão pelo rosto. Com fúria e desalento lembrou dos prazos com seu agente, com seu editor. Nervoso, dirigiu-se à janela. Uma lufada de vento refrescou-lhe as faces.

Olhou o horizonte longe, pontilhado de luzes. Percorreu com os olhos cansados as ruas lá embaixo, seguindo alguns faróis - vaga-lumes na noite - até uma curva qualquer que os escondesse.

Inclinando ainda mais a cabeça para baixo, pensou nos prazos, em seu agente irritado, no editor aguardando respostas. Cerrou a mão. Respirou fundo, exausto, e com força. Passou as mãos no rosto e afastou prontamente, com um balançar de cabeça, a ideia que, nos últimos dias, insistia em apoderar-se de seus pensamentos. Tal qual uma patologia crônica.

Abruptamente fechou a janela. Encaminhou-se até o caderno e à caneta, espalhados pelo chão do apartamento. Recolheu ambos. Tentou escrever novamente. Em vão. Largou os objetos sobre a mesa. Percorreu o olhar por alguns dos volumes em suas prateleiras. Pensou nos grandes autores, dispostos lado a lado, aleatória e displicentemente. E mais uma vez lhe veio à mente os prazos, seu agente, seu editor...

Lentamente dirigiu-se à janela. Abriu-a. Olhou para longe. Em seguida para baixo. E novamente para longe... Suspirou fundo... Uma miríade de luzes da cidade aproximava-se de uma infinidade de estrelas que se tornavam mais visíveis à medida que a noite se aprofundava no céu. Tudo suspenso num negrume só.

...................... Olhou até fundir-se, também, nos pontinhos prateados do terrível universo... Sentiu o corpo em velocidade. Um vento rápido e agradável atravessava-lhe o corpo de modo estranho. Tudo passava numa velocidade estonteante, e ele já não sabia o que acontecia. Apenas sentia como se aproximava, cada vez mais, das estrelas.

Lembranças boas mesclavam-se ao pensamento, enquanto uma calma quase celestial invadia, paulatinamente, todo seu ser. E cores passavam em majestosos e fugidios borrões pelos seus olhos, pintando um quadro tão único, numa linguagem tão simples, clara, mas inexplicável. Uma vertigem dominava-lhe os sentidos, na mesma proporção que se entregava àquela inebriante sensação de liberdade e plenitude velozes.

Um baque surdo na calçada. Aglomeração de pessoas em torno de alguém que caíra do último andar de um edifício... O corpo, pastoso, espalhava-se no chão. Esguichos vermelhos formavam um raio ao seu redor. O sangue brilhava e refletia as estrelas e luzes do alto.

Os olhos, ainda brilhantes, fitavam, além, o céu noturno. Um brilho e ternura puros visavam constelações longínquas, com uma convicção sublime de alguém que descobrira algo único. Algo que colocava qualquer artista num nível elevado de criação.

                                                 (? - 22/11/2016)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Do vento

O vento soprou
trazendo alento e alívio
pelo que passou.
             
                    (Haicai XIV, 17-11-2016)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Despedida

É triste, mas necessário, dizer adeus. Triste porque, a partir de agora, restarão apenas lembranças; e necessário pois as pessoas, em geral, só evoluem após a passagem de etapas e obstáculos que encontram em seus caminhos.

Assim, é com bastante orgulho que eu vejo o final desse ciclo na vida de vocês, alunos - afinal sei o quanto foi difícil para cada um vencer essa batalha representada pela escola.

E quando me refiro às dificuldades, não quero dizer apenas as relacionadas aos conteúdos escolares. Falo das dificuldades da vida mesmo: problemas pessoais, adolescência, sociedade, trabalho, desejos, medos, esperanças, frustrações etc. São estes obstáculos que vocês venceram diariamente para conseguirem estarem aqui. E é por isso que vocês têm a minha eterna admiração.

Saibam que, além de vitorioso, esse adeus representa metade do sucesso das suas vidas. E esta metade será o degrau que os levarão ao sucesso que os esperam. Desejo e sei que encontrarão este sucesso - seja ele qual for.

Deixo, aqui, um último conselho: apesar dos problemas que surgirão na estrada que irão trilhar, permaneçam nela até o fim e serão vitoriosos como foram aqui. Não desistam nunca, pois como diz Raul Seixas em uma de suas músicas "nunca é tarde demais pra recomeçar tudo outra vez".

Sejam críticos e observadores do mundo que nos rodeia. Aprendam a cair e, principalmente, a levantar. Tornem-se, dia após dia, melhores, inteiros e, assim, grandes. Sempre.

Abraços e (mais) vitórias.

De alguém que quis ajudar. Sinceramente.