segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Sobre Lição de anatomia, de Alan Moore

Recentemente, li a narrativa em quadrinhos Lição de anatomia, arco de histórias do Monstro do Pântano, escrita pelo já lendário Alan Moore, desenhada pelo magistral Stephen Bissette e artefinalizada por John Totleben. E a considero extraordinária.

Publicada pela editora brasileira Metal Pesado, no ano de 1997, sob o selo Obras Primas Vertigo – N°1 (em preto e branco), conta com uma boa introdução, escrita por Moore, que serve para situar o leitor sobre as fases anteriores do personagem, e mais dois textos: um do estudioso das narrativas sequenciais Álvaro de Moya e o outro do (editor?) Jotapê, ambos bem importantes por trazerem um panorama do gênero terror nos quadrinhos e, também, curiosidades sobre publicações da DC Comics e seu rico universo.

Lição de anatomia é fantástica e chama atenção, principalmente, pelo seu enredo e pelo modo como este é disposto na sucessão das páginas. O roteirista escreve e distribui quatro microcontos de horror que, quando unidos, compõe um todo incrível, minuciosamente arquitetado, envolto numa insana atmosfera cinza, pegajosa, úmida e realmente assombrosa que mistura humanidade, política e ideologia – a típica simbiose realizada pelos bons escritores e pelas boas histórias em quadrinhos.

Assim, o Monstro do Pântano luta, página após página, contra o fato de se descobrir, simplesmente, uma casca oca, vazia, desprovida de sentimentos e de essência humana. Este, além de digladiar com seus medos interiores refletidos em seu aspecto exterior, simboliza a unidade resultante do homem com a natureza – indissociáveis e interdependentes na História.

A narrativa apresenta, ainda, um tom político e ideológico, pois termina abarcando o discurso ambientalista de proteção à natureza e criticando a inutilidade das cúpulas do poder mundial (tal como a apática ONU na questão Israel x Palestina) sobre as Guerras – seja do homem com ele mesmo, seja deste em relação a sua sanha expansionista sobre o planeta, não respeitando os recursos naturais para se atingir gananciosos fins.

Desse modo, é crítica e significativa a aparição (mesmo que obrigatória) da Liga da Justiça (da América, claro!) que, à distância – tal como os poderosos grupos que decidem os destinos do mundo – discutem, ponderam, refletem... mas não agem, não se envolvem no corpo a corpo dos problemas que realmente afetam milhares de indivíduos. Não, isso fica a cargo dos verdadeiros donos do poder: o povo – tão bem representado por um aparentemente simples camponês e sua necessidade de lutar pela sobrevivência, enfrentando o vilão que encarna a fúria da natureza e que passa a destruir tudo a sua volta, almejando a aniquilação do ser humano – até compreender que ele próprio é resultado da simbiose e da interdependência Homem/Natureza.

Esse enredo, todo bem amarrado e ricamente materializado pela arte sensacional dos artistas Bissette e Totleben, faz dessa história em quadrinhos, incontestavelmente, uma pérola dos anos 80, engrandecendo, ainda mais, a arquitetônica estética do escritor Alan Moore. Merecidamente.