segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Na realidade do mundo

Em 2013, após relatos de que a Síria havia feito, em sua própria população, uso (e guardava um arsenal) de armas químicas - situação semelhante a do Iraque, há alguns anos - , os Estados Unidos da América, oportunamente, quiseram intervir, alegando ser aquilo um perigo para o resto do mundo. Claro que o que estava em jogo, assim como na situação iraquiana, era a tomada de um território riquíssimo em petróleo.

Pois bem, a situação continuou, os conflitos entre o governo sírio e os rebeldes - também sírios -continuaram, e os EUA persistiram em pressionar a opinião pública a apoiar uma invasão. Que por sorte - ou pelo fato da Síria ter o "apoio" da Rússia - não aconteceu (do jeito que os líderes americanos queriam, é claro!). Acontecesse, já não estaríamos aqui - tão vasto é o poderio nuclear das duas potências!!

O que aconteceu mesmo fora um massacre - que com uma invasão só se potencializaria! - entre governo, rebeldes e a população no meio, arcando com os "efeitos colaterais".

Mortes e mais mortes...e a tensão de que uma Terceira Guerra Mundial acabaria com tudo... Foi isso o que sentiu, penso eu, quem acompanhou os jornais naquelas dias.

Em meio a esse cenário, envolvido em tal atmosfera, fora escrito o poema "Na realidade do mundo".


Na realidade do mundo

Preciso escrever alguma coisa!
É sobre esse cheiro: ODOR!
Que exala das notícias
Das páginas dos jornais
Da televisão do rádio
E das bocas dos poucos que falam...
É um cheiro (ODOR) de morte
Putrefação
Vala comum com amontoados de corpos
SINTAM...
É quase possível tocá-lo
Impregna as narinas, entorpece o cérebro
É um odor que traz consigo sons
- gritos, soluços, tiros e bombas
gemidos estridentes: GUERRA!
E estes sons entoam uma canção
embalada no medo
- Cantada pelo Medo -
Que traz o sono
e a insônia
- com seus pesadelos
escorraçando os sonhos
e as esperanças
escancarando sua boca
e nos engolindo
e nos vomitando
despidos de TUDO
Nus e com frio
Na realidade do mundo.    
       (3/9/2013)

***      
                     
Em janeiro deste ano - esperançoso de ter passado o susto -, lendo o quadrinho japonês GUNNM - Hyper Future Vision*, do autor Yukito Kishiro, deparei-me com essas palavras, ditas pelo personagem Buick, fotógrafo, perdendo sua sanidade em face ao terror da guerra:

Nascemos e morremos...
Sem parar...
Sem parar...
Nada muda...
não conseguimos mudar nada...

O sol majestoso no céu
e cadáveres na terra...
Ferro queimado...
A verdadeira imagem do mundo
É confusão e caos.
Essa é a única lei que realmente vale.

Eu sinto que estava tendo um sonho gostoso,
Mas eu já me esqueci do que se tratava...

A fumaça esconde tudo que está distante...
O futuro é incerto...
Eu não quero mais ser um humano...

Sou uma lente esfomeada!
Sou o olho da morte
que devora tudo que vê!!!

E o que tem tudo isso? Simples: além do fato dos textos apresentarem a guerra como aterradora e ensandecedora, faz pensar, também, como as coisas do mundo parecem entrelaçar-se de tal modo que dão a impressão de que tudo já está planejado e que apenas representamos nossos tristes papéis numa peça teatral onde não conhecemos os escritores, diretores, figurinistas, sonoplastas e todos os outros que permanecem atrás das cortinas e das luzes.

E isso chega a ser tão apavorante quanto o fato de estarmos em meio a esta guerra.



* Trecho retirado do volume 16 do mangá.







Um comentário:

  1. Espero que muitos outros visitem esse blog para que possam contemplar a beleza de suas palavras e o encanto do seu estilo de escrever. É fascinante essas pausas marcadas por vírgulas que você usa para enfatizar as ideias. Na tentativa de passar ao leitor suas indignações e opiniões, você de um jeito singular e inconfundível encanta de forma simples mas direta por meio desses textos. Boa sorte com suas brilhantes publicações.Um beijo e eu te amo muito.

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